Um mergulho no amor

Nasci e cresci em São Bernardo do Campo (SP), onde também frequentei a universidade. Por algum tempo, assim como para tantos outros jovens, o centro de minha vida foram meus estudos e minha profissão. Assim que me formei em direito, meu objetivo era entrar para o Ministério Público, onde parecia possível fazer algo pelas pessoas mais vulneráveis: um objetivo que exigia muito tempo e dedicação. Eu dividia essa prioridade com a responsabilidade de morar sozinha, trabalhar e construir um futuro com meu namorado, enquanto almoçávamos nos fins de semana na casa de nossos pais.Devo dizer que, naquela época, o relacionamento pessoal com Deus não estava entre as minhas prioridades e sempre que eu tinha um movimento interior nesse sentido, eu costumava sufocá-lo com a desculpa de todas as coisas que tinha para fazer. Aconteceu, porém que, em meio a todas essas coisas, de repente e aos poucos, nos fatos concretos da vida, percebi que eu, assim como cada pessoa, era a prioridade de Deus.

Por pura graça tive meu encontro pessoal com Jesus, e ali me senti como se tivesse sido imersa em um mar de Amor, com ondas enormes e infinitas, repletas de misericórdia e intimidade com Deus, com a mesma força e desproporção das águas que ninguém pode controlar. Nesse mergulho, reconheci claramente a verdade que nos ultrapassa e percebi que tudo o mais, de algum modo, era como uma ilusão comparada ao amor de Deus.
Dali em diante, se eu não quisesse viver conscientemente uma “vida falsa”, a minha vida precisava mudar. Com o tempo e com essa inquietação que estava me sufocando, um chamado que eu não conhecia começou a tomar forma na minha vida, um pouco como aconteceu com o jovem rico:
Jesus o olhou e o amou e disse-lhe... (e assim também para mim...): Uma só coisa te falta: vai, vende tudo o que tens, dá aos pobres e terás um tesouro no céu. Depois, vem e segue-me!” (Mc 10,21).

Tive a graça de ter uma boa direção espiritual, que ainda tenho e cujo centro é especialmente a fé na Palavra de Deus. Assim, minha resposta também começou a tomar forma.
Não foi fácil... O chamado de Deus exigia de mim uma resposta total e isso significava abandonar o que já havia sido construído com dedicação e amor. De fato, era necessário me desfazer dos planos para o futuro, e ver uma pessoa querida partir. Além disso, tive que enfrentar a dor de deixar minha família, me colocando à disposição de um futuro desconhecido, enquanto na fé eu encontrava a única segurança.
Quando conheci as Missionárias Seculares Scalabrinianas, eu já havia dito meu sim a Deus. Eu estava em um período de busca para entender onde viver concretamente essa minha entrega total. E, para caminhar com confiança no discernimento, a direção espiritual sempre foi fundamental.
Através do meu diretor espiritual, um Missionário Scalabriniano, fui convidada pela primeira vez para um encontro de formação para jovens no Centro Internacional Scalabrini, realizado pelas Missionárias Seculares Scalabrinianas em São Paulo. Fui sem nenhuma expectativa, dado que não se tratava de um encontro vocacional. Durante o trajeto de cerca de uma hora, uma colega, que já havia participado várias vezes desses encontros, me explicou um pouco sobre a vocação dessas Missionárias: mulheres leigas consagradas que vivem seus votos no mundo, inseridas em todos os ambientes onde qualquer outra pessoa pudesse se encontrar, buscando fazer crescer a vida do Evangelho a partir de dentro das situações: um fermento de vida nova, especialmente entre os migrantes e os jovens.
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Com as Missionárias, esse foi apenas o primeiro de outros encontros dos quais participei, até que, justamente naquela realidade, nova sob tantos aspectos, reencontrei o dom do meu chamado, agora específico, que me pedia um novo sim incondicional. Após um período de tempo, de encontros e experiências, entrei na comunidade de São Paulo e vivo o período de formação inicial tanto no Brasil como na Alemanha.
Me vem sempre um sorriso quando percebo que, na consagração secular, encontrei muito mais do que estava procurando. Caminhando em comunhão, é possível ir cada vez mais em profundidade, descobrindo o centro desse carisma que não apenas responde ao meu desejo de totalidade, mas me desafia na sua origem a viver radicalmente a realidade mais profunda da nossa fé, a Páscoa, o Cristo crucificado e ressuscitado, o Amor.
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A espiritualidade da encarnação de São J. B. Scalabrini, e o caminho com a comunidade, me ensinaram a viver a consagração não só como um pertencimento radical, mas também como um caminho para que, na pequenez, a encarnação de Jesus se prolongue na história. De fato, São J. B. Scalabrini, homem de esperança, na certeza do que esperava, não ficou de braços cruzados, mas se fez tudo a todos.
Os votos fazem parte de um sim que livremente escolhemos dizer para um Outro que, com sua presença, relativizou para mim todas as outras possibilidades para abrir um caminho fecundo, que se desenvolve na vida cotidiana e em nossa própria pequenez, enquanto abre espaço para a vida d‘Aquele que me chamou para segui-lo, migrante com migrantes.

Thamiris
Artigo completo na revista: Pelas estradas do êxodo (2023)


Articolo in italiano: Sulle strade dell'esodo (2023 n.3)